Chegamos pois a precisar, o mais possível, o significado da palavra “cavaleiro”, enquanto indicando aquele que pertence à Cavalaria:
é um homem de armas que, por suas virtudes naturais e morais, recebe uma distinção honorífica inteiramente pessoal, por isso mesmo não transmissível por hereditariedade, e que lhe confere o poder e o juízo de armar outros homens de armas como cavaleiros.
Esta distinção honorífica acarretava uma série de privilégios para aqueles que pertencessem à Cavalaria. O“Grand Dictionnaire Universel Larousse”, tratando do assunto, afirma o seguinte:
“A dignidade de cavaleiro era tão considerada, que o próprio rei sentia honra em sê-lo. Os cavaleiros sentavam-se à sua mesa, coisa que nem seus filhos, irmãos ou sobrinhos podiam fazer, a não ser quando fossem recebidos na Cavalaria.
“Usavam uma capa de honra, aberta no lado direito e presa por um alfinete no ombro, para deixar o braço livre no combate. Durante toda a Idade Média, somente o cavaleiro podia levar sua espada à cintura; os outros a suspendiam por um talabarte”.
Um outro sinal distintivo dos cavaleiros é o uso de esporas de ouro. Que essa prerrogativa fosse específica dos membros da Cavalaria, é o que faz supor a seguinte afirmação de Paul Lacroix no livro “Les Arts au Moyen Âge et à l’époque de la Renaissance”:
“Para ganhar suas esporas (de ouro) — expressão que ficou proverbial — era necessário fazer alguma ação brilhante, que mostrasse quanto se era digno de ser armado cavaleiro.
“A cerimônia de recepção começava pela entrega das esporas, e aquele que conferia a ordem de Cavalaria, fosse rei ou príncipe, tomava sobre si o encargo de calçá-las no próprio recipiendário”. (Paul Lacroix, “Les Arts au Moyen Âge et à l’époque de la Renaissance” - Firmin Didot Frères, Fils et Cie., Paris, 1874)
Todos esses sinais exteriores serviam para simbolizar aquela excelência honorífica que possuíam os cavaleiros face aos demais homens de armas do exército feudal.
Note-se, no entanto, que essa excelência não importava em ascensão na hierarquia feudal ou em possuir equipamento militar mais completo.
A Cavalaria constituiu uma dignidade de ordem moral, que conferia àquele que com ela fosse honrado uma investidura de caráter praticamente religioso.
Léon Gautier, em importante obra consagrada ao assunto, chegou a qualificar a Cavalaria de “oitavo sacramento”.
Um padre que casasse, e fosse preso vestindo trajes civis, deveria ser conduzido a um tribunal eclesiástico.
O mesmo se passava com o cavaleiro. Por outro lado, ele usufruía vários privilégios consagrados ao clero.
Clérigos e cavaleiros eram homenageados da mesma forma. Nas comparações que fazem entre clero e cavalaria, os autores mais antigos sustentam que ao cavaleiro deve ser imposta a obrigação do celibato.
São três as ordens necessárias para o bom funcionamento de um Estado: O sacerdote, para cuidar do culto e das orações; o trabalhador, para cuidar do campo; e o cavaleiro, para proteger a ambos e sustentar a justiça.
A Cavalaria — diz o autor de Jouvencel — é o que são os braços para o corpo, isto é, dispostos para defender, sempre que necessário, a cabeça (a Igreja) e as pernas (o povo).
A Cavalaria é então um como que sacerdócio, mas de caráter militar.
Se uma jovem dama se tornasse herdeira de um importante domínio, ou se uma mulher ficasse viúva e com terras para administrar, recorria a um cavaleiro para que protegesse seus bens, tomasse a guarda do seu castelo e o comando dos homens de armas. O cavaleiro recebia com isso o título de visconde ou de castelão.
Os cavaleiros eram considerados por todos como um grupo de elite.
Quem podia ser armado cavaleiro?
A primeira condição exigida era, naturalmente, a Fé Católica.
A ideia de se fazer armar cavaleiro a um sarraceno faria explodir de rir. Em seguida era preciso que ele montasse a cavalo, soubesse manejar a lança, a acha e a espada, e devia mover-se livremente sob uma armadura de aço.
Não eram admitidos na Cavalaria aqueles que estivessem desonrados por costumes.