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A movimentada vida dos engenheiros medievais

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continuação do post anterior: A revolução industrial da Idade Média: os surpreendentes planos de Villard de Honnecourt




Villard de Honnecourt procurava também o meio de facilitar o transporte e içamento de cargas. Graças aos manuscritos iluminados, sabemos que os construtores de catedrais já utilizavam toda a sorte de máquinas (guinchos, polias, cabrestantes, etc.) para esse efeito.

Mas Villard foi o primeiro a desenhar um parafuso combinado com uma alavanca, ou seja, um macaco, a respeito do qual diz que “por este meio faz-se um dos mais potentes engenhos para içar os fardos”.

Villard desenhava, em primeiro lugar, por motivos técnicos, mas também porque certos elementos arquiteturais lhe agradavam. Em Reims, por exemplo, desenhou uma janela da nave “porque a preferia”, diz ele.

Executou esse desenho por volta de 1230, mas, e este é um ponto interessante, não copiou essa janela exatamente como era. Talvez inconscientemente, “ele modernizou” uma janela que devia datar de 1211.

Com efeito, ele “modernizou” outros edifícios, entre os quais, uma das torres da catedral de Laon, pela qual Villard exprimiria sua admiração.

Os bois curiosamente esculpidos no ângulo de cada torre ainda hoje podem ser vistos no local exato onde Villard fez seu desenho, há mais de 700 anos.

Em Chartres, ele fez um croqui “interpretado” da grande rosácea da fachada ocidental. Depois, recopiou o labirinto, mas invertendo-o.

Infelizmente, como a placa que dava o nome dos arquitetos provavelmente desapareceu, o desenho de Villard nada nos revela.

Ele também desenhou, transformando-o ligeiramente, um dos janelões de vitral do transepto Sul da Catedral de Lausanne, que se encontrava no trajeto seguido por Villard para ir à Hungria, aonde o tinham convidado.

Villard orgulhava-se imenso dessa viagem, que jamais esqueceu e de que fala abundantemente em seu compêndio. Fora chamado pelos monges cistercienses que desenvolviam então seus mosteiros na Hungria?

Ou teria sido convidado porque a irmã do rei, Elisabeth de Hungria, antes de sua morte em 1231, fez uma doação à Catedral de Cambrai?

Elisabeth de Hungria foi canonizada e talvez tenha sido Villard de Honnecourt quem edificou em Kosice (na Eslováquia atual) a catedral dedicada a essa santa.


Há 16 estátuas de bois em pedra nas torres da catedral de Laon.

Em 1114, durante a restauração da catedral, caiu extenuado um boi que puxava uma charrete.

Viu-se então um boi desconhecido completar a tarefa e desaparecer misteriosamente.

Em lembrança do fato maravilhoso foram instaladas 8 estátuas em cada torre.

O boi é símbolo do Evangelho de São Mateus porque põe em destaque os lados humanos de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Tendo chegado à Hungria em 1235, Villard multiplicou aí seus esboços, a fim de constituir uma reserva de formas e modelos. De todos esses desenhos, apenas restou um, representando o lajeado de uma igreja.

Na Idade Média, não era raro ver arquitetos-engenheiros visitarem países considerados em “vias de desenvolvimento” por comparação com a França do século XIII, um pouco como têm feito os engenheiros americanos do século XX, oferecendo sua assistência técnica às nações jovens, para ajudá-las a construírem suas centrais hidrelétricas e suas siderúrgicas.

A 30 de agosto de 1287, o arquiteto Étienne de Bonneuil assinou, na presença do Preboste de Paris, um contrato que precedia a sua viagem à Suécia:

“Nós, Renaut le Cras, Preboste de Paris, fazemos saber que Étienne Bonneuil compareceu ante nós e declarou aceitar ser o mestre-pedreiro e empreiteiro da Igreja de Upsala, na Suécia, para onde se dispõe a viajar.

Mestre de pedreiros distribui as tarefas
Mestre de pedreiros distribui as tarefas
“Reconhece ter recebido de pleno direito, para seu pagamento, a soma de 40 libras parisias das mãos dos senhores Olivier e Charles homens de leis e tabeliães em Paris, a fim de levar consigo, por conta do canteiro de obra da sobredita igreja, quatro pedreiros e quatro operários solteiros para talhar e esculpir a pedra, pensando que isso seria um benefício da dita igreja.

“Por essa soma, ele compromete-se a levar os ditos operários a esse país e a pagar todos os seus gastos.

“E se acontecer que Étienne de Bonneuil e seus companheiros de viagem pereçam no mar, numa tempestade ou de qualquer outra maneira, antes de chegarem à Suécia, ele, seus companheiros e seus herdeiros serão liberados do reembolso da sobredita quantia”. (V. Mortet e P. Deschamps, Recueil de textes relatifs à l'histoire de l'architecture et à la condition des architectes en France au Moyen Age, XlIe-XIIIe siècles, VoI. II, Paris, 1929, pp. 305-6.)

De regresso à Picardia, Villard trabalhou provavelmente na igreja colegial de Saint-Quentin e transformou o seu Carnet de Notes, até então para seu uso pessoal, em livro de canteiro de obras. Adicionou-lhe notas explicativas para elucidar certos croquis.


(Autor: Jean Gimpel, “A revolução Industrial da Idade Média”, Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1977, 222 páginas).

continua no próximo post: A Idade Média à procura do Movimento Perpétuo para resolver o problema da energia



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