Horloge de la Sapience, Henri Suso, Bibliothèque royale de Belgique, ms IV 111, f 13v. |
continuação do post anterior: A movimentada vida dos engenheiros medievais
Sabemos que, após a morte de Villard, duas gerações, pelo menos, utilizaram o seu álbum.
Os especialistas identificaram em certas folhas a escrita mais recente de dois comentadores anônimos do final do século XIII, denominados, por uma questão de comodidade, Magister I e Magister II.
Mas os desenhos de mecanismos são todos do punho de Villard e o mais interessante relaciona-se com o problema do movimento perpétuo.
Esse desenho reflete o interesse apaixonado com que os homens da Idade Média procuravam novas fontes de energia. Para aumentar a produção energética, eles investigaram além da energia eólia, hidráulica e das marés:
Projeto de movimento perpetuo de Villard de Honnecourt
“O mundo inteiro acabou por ser apenas, aos olhos deles, um vasto reservatório de forças naturais que era possível captar à vontade e utilizar para satisfação das necessidades e dos desejos humanos.
“Sem a ousadia de sua imaginação e mesmo sem a fantasia de algumas de suas criações, a potência energética do mundo Ocidental jamais se poderia desenvolver” (Lynn White, Technologie médiévale et transformations sociales, Mouton, Paris-Haia, 1969, pp. 137-8.)
Pouco importa que os mecanismos do irrealizável movimento perpétuo, imaginados no século XIII, nunca tivessem funcionado.
O que importa é que tenham sido encontrados no século XIII cientistas e engenheiros para tentar construir esse movimento com fins práticos.
Villard de Honnecourt compartilha com outros contemporâneos seus da honra de ter trabalhado nesse sentido:
“Inúmeras vezes discutiram entre si os mestres para fazer girar uma roda por si mesma. Eis como é possível fazê-lo, por meio de malhetes não pares e mercúrio”.
Em 1269, Pierre de Maricourt, um dos grandes cientistas do seu século, sublinhava em sua obra sobre o magnetismo o vivo interesse dos investigadores por esse problema: “Vi muitos homens exaustos em sua investigação para inventar essa roda”.
Villard, por sua parte, pensava ter encontrado a boa solução, mas, nesse domínio, não foi um inovador, pois a noção de movimento perpétuo já era conhecida no século XII na Índia, onde florescia uma rica tradição de filosofia cíclica.
Reconstituição moderna do projeto de movimento perpetuo de Villard de Honnecourt |
Ele imaginou dois sistemas. O primeiro é o esquema de uma máquina animada de um movimento magnético perpétuo.
Eis como ele descreve o segundo:
“Um ímã esférico que, na condição de ser montado sem fricção paralela ao eixo celeste, giraria uma vez por dia. Corretamente inscrito numa carta dos céus serviria de esfera armilar automática para as observações astronômicas e os relógios, permitindo assim dispensar-se qualquer outro aparelho de medição do tempo.” (Technologie médiévale, op. cit., p. 137.)
(Autor: Jean Gimpel, “A revolução Industrial da Idade Média”, Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1977, 222 páginas).
continua no próximo post: Energia industrial para invenções e “gadgets” em plena era medieval