Luis Dufaur Escritor, jornalista, conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
A noção da família medieval bem compreendida repousa sobre uma base material — a herança de família, bem fundiário em geral — porque desde os começos da Idade Média a terra constitui a única fonte de riqueza, e permanece consequentemente o bem estável por excelência.
Dizia-se então:
Héritage ne peut mauvoir
Mais meubles est chose volage.
Uma herança não pode movimentar-se
Mas os móveis são coisa instável.
Esta herança familiar, quer se trate de um arrendamento servil ou de um domínio senhorial, permanece sempre propriedade da linhagem.
É impenhorável e inalienável, os reveses acidentais da família não podem atingi-la.
Ninguém pode tomá-la, e a família também não tem o direito de a vender ou negociar.
Quando o pai morre, a herança de família passa para os herdeiros diretos.
Tratando-se de um feudo nobre, o filho mais velho recebe quase a sua totalidade, porque a manutenção e defesa de um domínio requer um homem, e que seja amadurecido pela experiência.
Esta a razão do morgadio, que a maior parte dos costumes consagra.
Para os arrendamentos, o uso varia com as províncias, sendo por vezes a herança partilhada, mas em geral é o filho mais velho quem sucede.
Notemos que se trata aqui da herança principal, do patrimônio de família.
Em tal circunstância as outras são partilhadas pelos filhos mais novos, mas é ao mais velho que cabe o “solar principal”, com uma extensão de terra suficiente para ele viver com a sua família.
É justo, pois afinal o filho mais velho quase sempre secundou o pai, e depois dele é quem mais cooperou na manutenção e na defesa do patrimônio.
Em algumas províncias, tais como Hainaut, Artois, Picardie e em algumas partes da Bretanha, não é o mais velho, e sim o mais novo o sucessor da herança principal.
Uma vez mais, isso ocorre por uma razão de direito natural, porque numa família os mais velhos são os primeiros a casar, estabelecendo-se então por conta própria, enquanto o mais novo fica mais tempo com os pais e cuida deles na velhice.
Este direito do mais jovem [sem correspondência em Portugal, normalmente esta sucessão de patrimônio passava para os filhos segundos] testemunha a elasticidade e a diversidade dos costumes, que se adaptam aos hábitos familiares de acordo com as condições de existência.
(Fonte: Régine Pernoud, “Lumière du Moyen Âge”, Bernard Grasset Éditeur, Paris, 1944)